Um quadrilátero é inscritível se, e somente se, a soma dos ângulos opostos é .
Por exemplo, na figura, e .
Proposição[]
Um quadrilátero é inscritível se, e somente se, ele possui um ângulo externo com mesma medida que a do ângulo oposto ao seu adjacente.
Exemplo[]
Prove que um trapézio (que não é paralelogramo) é inscritível se, e somente se, é isósceles.
Solução: Seja este trapézio, de bases e .
() Como é inscritível,
Mas e são paralelos. Desta forma, se pertence ao prolongamento de tal que está entre e , então
Além disso,
Se combinarmos e ,
Com isso, é um trapézio isósceles.
() Como é isósceles e não é um paralelogramo,
Mas e são paralelos. Se pertence ao prolongamento de de forma que esteja entre e , então
Com isso,
de onde segue que o quadrilátero é inscritível.
Exemplo[]
Mostre que um quadrilátero é inscritível se, e somente se, as mediatrizes dos quatro lados se encontram em um único ponto.
Solução: Se é inscritível existe uma circunferência que passa pelos pontos , , e . Seja o centro dessa circunferência. O ponto pertence a mediatrizes de todos os lados, pois ele é equidistante a todos os pontos. Logo, todas a mediatrizes se encontram em .
Seja o ponto de intersecção entre as quatro mediatrizes. Basta traçarmos uma circunferência de centro e raio e esta passará pelos pontos , , e . Logo, é inscritível.
Exemplo (OBM 2021 - Nível 3)[]
Sejam um quadrilátero convexo no plano e , , e os circuncentros dos triângulos , , e , respectivamente. Suponha que esses quatro circuncentros sejam pontos distintos. Prove que esses pontos não estão em uma mesma circunferência.
Solução: Aqui, faremos uma prova por absurdo, isto é, vamos supor que o quadrilátero é cíclico e chegar a uma contradição. A primeira coisa a se notar é que como os quatro circuncentros são pontos distintos, o quadrilátero não é cíclico. E depois disso? Por onde começar? Vamos entender melhor quem são os lados de antes de supormos que ele é cíclico. Podemos ver que, como e são circuncentros de e , eles estão na mediatriz de ; mais do que isso, é a mediatriz de , assim como , e são as mediatrizes de , e , respectivamente. Faz sentido, então, prolongar essas mediatrizes até os pontos médios de . Seja o ponto médio de , e defina , e analogamente. Teremos algo como a figura abaixo:
Como são mediatrizes, , e as outras relações seguem analogamente, o que significa que , implicando que o quadrilátero um quadrilátero inscritível, pois seus ângulos opostos são suplementares. Por um motivo análogo, também é inscritível.
Vamos supor, por absurdo, que é cíclico. Então e são suplementares, mas como é inscritível, então e são suplementares, donde . Analogamente, como é inscritível, , donde e são suplementares, o que implica que é cíclico, um absurdo, porque os quatro pontos são distintos! Então não pode ser cíclico.
Exemplo (IMO Shortlist 2019)[]
Seja um triângulo. O círculo passa por , e intersecta os segmentos e em e , respectivamente, e o segmento nos pontos e , de forma que está entre e . A tangente ao circuncírculo de que passa por e a tangente ao circuncírculo de que passa por se encontram em . Prove que é paralelo a .
Solução. As tangências implicam que e , consequentemente,
Analogamente, .
Como o pentágono é inscritível, então e . Assim, pelo caso ALA, os triângulos e são congruentes, porque compartilham o lado . Consequentemente, eles têm a mesma altura e, portanto, e estão à mesma distância de , portanto, .
Exemplo (OBM 2003 - 3ª Fase - Nível 2)[]
O triângulo está inscrito na circunferência e . A reta que contém e é perpendicular a encontra em (). O ponto situa-se sobre o segmento e a reta intersecta em (). Mostre que se, e somente se, é um diâmetro de .
Solução: Existem possibilidades para onde o deve ficar. no arco que não contém ; no arco que não contém ou no arco que não contém .
Vejamos cada caso separadamente.
1º Caso: pertence ao arco que não contém .
Basta pegarmos algum ponto (diferente de e ) tal que .
Vamos mexer com ângulos. Para isto, vamos aproveitar que : deste fato segue que . Chamaremos esta medida de . Se mostrarmos que , terminaremos o problema (pois isto implicaria que , de onde poderíamos concluir que é o diâmetro.
Observe que . Além disso, e "enxergam" o mesmo arco, segue que .
Considere . Calcularemos outras medidas em função de . Observe que e e "enxergam" o mesmo arco, onde segue que .
Vamos usar a hipótese, já que ainda não falamos dela. Como é o diâmetro, e assim . Pela Recíproca do Teorema do Triângulo Isósceles, .
2º Caso: pertence ao arco que não contém ;
Basta provarmos que . Para isto, vamos marcar alguns ângulos na figura. Quais? Aqueles que podemos tirar informações legais. Por exemplo, é legal considerar , pois aí podemos usar que e concluir que . Também podemos usar é perpendicular a . Consideremos . Considere o ponto de encontro entre o prolongamento de e . Segundo o enunciado, pela definção de , . Além disso,
.
Vamos calcular e também em função de e , para depois usarmos o fato de que
.
Como a soma dos ângulos internos do triângulo é , segue que]
.
Além disso, e "enxergam" o mesmo arco, segue que . Desta forma,
.
Portanto, é diâmetro.
Façamos . Mostraremos que . Vamos procurar alguma forma de usar que é diâmetro. O que mais podemos usar a nosso favor? Que . Como , segue que
(basta usarmos que a soma dos ângulos internos de é ).
Como é diâmetro, segue que . Assim,
.
Portanto, (pois ambos "enxergam" o mesmo arco). Desta forma, .
3º Caso: pertence ao arco que não contém .
Mostraremos que . Para isto, a estratégia aqui será a seguinte: mostraremos que
.
Consideremos (para podermos usar a hipótese). Para nos ajudar, definiremos também, . Sabemos que (pois eles "enxergam" o mesmo arco). Além disso,
.
Finalmente, , de onde segue que
.
Logo,
,
de onde segue que e assim, é diâmetro.
Considere , e . Provaremos que . Como é diâmetro, de onde segue que e assim . Vamos calcular novamente, porém em função de , e . Observe que (pois eles "enxergam" o mesmo arco). Além disso
,
de onde segue que
.
Finalmente, como a soma dos ângulos internos do triângulo é , segue que
.
Desta maneira,
.
Portanto, .
Exemplo (OBM 2016 - 3ª Fase - Nível 2)[]
Considere um triângulo com . A mediatriz do lado corta o lado no ponto e o prolongamento de no ponto . A mediatriz do lado corta o lado no ponto e o prolongamento do lado no ponto . Prove que o quadrilátero é cíclico, ou seja, que seus quatro vértices estão em uma mesma circunferência.
Solução: Sejam e os pontos médios de e . Por ser uma base média, . Além disso, os pontos e estão nas mediatrizes dos respectivos lados, ao passo que , indicando que o quadrilátero é inscritível.
Com isso, e, pelo paralelismo que enunciamos antes, . Como , o quadrilátero é inscritível.
Exemplo (Cone Sul 2018)[]
Em um quadrilátero convexo tem-se que:
e são pontos no interior dos segmentos e , respectivamente, com e .
e são os pontos médios de e , respectivamente.
é o ponto médio de .
Sabendo que , demonstre que é um quadrilátero cíclico.
Solução: Já que o enunciado nos fala sobre a soma dos ângulos e é natural buscarmos usar isto para provar que a soma dos ângulos opostos do quadrilátero é . Vejamos se conseguimos relacionar esses ângulos.
Consideremos e os pontos médios de e respectivamente. Observe que e são bases médias dos triângulos e , respectivamente. Qual a vantagem de termos isto? Observe que
e
Se quisermos mostrar que , basta provarmos que . Mas aqui temos algo mais interessante: os ângulos e podem se relacionar de uma maneira melhor com os ângulos e . De fato, é ângulo externo ao triângulo que possui o ângulo . Da mesma forma, o ângulo é externo ao triângulo que possui o ângulo .
Para sabermos informações sobre os ângulos dos triângulos e , vamos extrair informações sobre seus lados. O enunciado nos deu informações sobre eles. Vamos ver se usamos elas para encontrar as medidas dos lados desses triângulos.
Se , então , pois é a base média do triângulo . Além disso, , de onde segue que . Conseguimos calcular em função de (já que queremos falar sobre os lados de que )? Como é ponto médio de , podemos considerar . Tomemos . Assim e . Mas é ponto médio de , de onde segue que
Desta forma, . Com isso, o triângulo é isósceles de base . Analogamente, o triângulo é isósceles de base . Se combinarmos isto com o Teorema do Ângulo Externo nos triângulos e ,
e
Assim
Desta forma, o quadrilátero é inscritível.
Exemplo (OBM 2005 - 3ª Fase - Nível 2)[]
No triângulo retângulo , os catetos e medem, respectivamente, e . Seja o ponto médio da hipotenusa e seja um ponto, distinto de , tal que e .
(a) Prove que é perpendicular a .
(b) Calcule a área do quadrilátero .
Solução:
(a) Como , segue que pertence a mediatriz de . Se mostrarmos que também pertence a essa mediatriz, terminaremos o problema. Se usarmos que é o ponto médio da hipotenusa e a hipótese , de onde segue que também pertence a mediatriz de .
(b) Observe que e . Resta calcularmos . Como aparece um ângulo reto, podemos usar a trigonometria. Observe que
.
Vamos tomar um ângulo fácil de calcularmos o seno e depois calcular em função dele. Façamos . Por que? É fácil calcularmos o seno e o cosseno deste ângulo, pois é um triângulo. De fato, e .
Como calcular em função de ? Note que como e é o ponto médio da hipotenusa, segue que este é um ponto equidistante de , , e . Logo, pertence a circunferência circunscrita ao triângulo . Legal: agora podemos chamar os ângulos na circunferência para nos ajudar.
Com a medida de conseguimos a medida do arco . Usemos o fato de que cordas iguais enxergam arcos iguais. Existe alguma outra corda que tem a mesma medida que ? Sim: segundo o enunciado . Desta forma, , de onde segue que . Se descobrirmos a medida de , conseguiremos a de .
Note que . Como é inscritível, segue que . Como a soma dos ângulos internos do triângulo é ^, segue que .
Desta forma,
.
Conseguimos calcular já que sabemos que e ? Sim. Observe que
.
Pela equação ,
.
Portanto,
Exemplo (IMO 2005)[]
Seja um quadrilátero fixo não convexo com e não paralelo a . Considere dois pontos variáveis e sobre os lados e , respectivamente e que satisfazem . As retas e se encontram em , e as retas e se encontram em , as retas e se encontram em .
Prove que os circuncírculos dos triângulos , conforme e variam, possuem um ponto comum além de .
Solução: Esse é um problema em que vale a pena fazer uma boa figura (com régua e compasso). Aliás, vale a pena fazer mais de uma boa figura. Algo que ajuda inclusive é fazer o quadrilátero de caneta e os pontos e (e os pontos que existem por causa deles) a lápis, afinal você pode apagar e fazer outros.
Também vale a pena pegar quadriláteros específicos. Um quadrilátero aqui que vale a pena pensar é no paralelogramo: quando fazemos a figura com régua e compasso, começamos a suspeitar que o circuncírculo de sempre passa pelo ponto de encontro das diagonais. O mesmo não parece valer para outros quadriláteros. O que o ponto de encontro das diagonais tem de especial no paralelogramo, mas não nos outros quadriláteros? Ele é o ponto médio de e de .
Quando pegamos um quadrilátero qualquer, o ponto por onde os circuncírculos passam não parecem ser pontos médios de e nem de . Mas será que não conseguimos enfraquecer um pouco a propriedade? Uma possível maneira é imaginar: o ponto de encontro das diagonais é equidistante de e de , além de ser equidistante de e de . Será que esse é um bom candidato? Se pensarmos que o conjunto dos pontos equidistantes é a mediatriz, defina como o ponto de encontro das mediatrizes de e . Com alguns desenhos, esse parece ser um bom candidato.
Como não depende de e nem de , se provarmos que são concíclicos, o problema acaba.
Devemos usar o máximo de informações possíveis. Por exemplo, como usar que pertence às mediatrizes de e ? Observe que por causa dessas informações, temos e . Ao usarmos essas duas informações, já parece que os triângulos e são congruentes. Só que vale mais uma coisa ainda: segundo o enunciado, . Desta forma, estes triângulos são congruentes pelo caso .
Já que estamos encontrando tantas coisas de mesma medida e temos uma igualdade entre segmentos ainda não utilizada (), faz sentido procurarmos outra congruência. Por causa dessa última igualdade e do fato de que , parece razoável suspeitar que os triângulos e são congruentes. Precisamos de mais um ângulo para provarmos isso. Note que, como e são congruentes, segue que . Desta forma, . Por isso, os triângulos e são congruentes.
Conseguimos ainda outra congruências. Observe que e (por causa da congruência entre e ), além de (afinal ). Por isso, os triângulos e são congruentes pelo caso .
Essas congruências nos ajudam com alguma coisa? Considere . Como , segue que . Note ainda que (por causa congruência entre e ). Por causa disso, . Como , podemos concluir que . Com isso, os pontos são concíclicos. Analogamente, o mesmo vale para .
Por sorte, o ângulo (que coincide com ) está tanto no quadrilátero formado por (que acabamos de mostrar que é inscritível) quanto no formado por (que queremos mostrar que é inscritível). Mais ainda, o ângulo (que coincide com ) está no quadrilátero formado por e no formado por (que queremos mostrar que é inscritível).
Por isso, faz sentido mirarmos em provar que . Repare que (pois o quadrilátero formados por é inscritível). Além disso, . Será que podemos relacionar com ? Lembre-se que os triângulos e são congruentes, de onde segue que . Desta forma,
Portanto, são concíclicos e assim todo circuncírculo de passa por .
Proposição[]
Um quadrilátero é inscritível se, e somente se, o ângulo formado por uma diagonal e um lado é igual ao formado pela outra diagonal e o lado oposto.
Para usar esta propriedade, sempre tenha em mente que
Se você encontrar quadriláteros inscritíveis, pode determinar mais ângulos na figura.
Se você ver ângulos iguais, procure formar quadriláteros inscritíveis.
Exemplo (Cone Sul 2002)[]
Seja um quadrilátero convexo tal que suas diagonais e são perpendiculares. Seja a interseção de e e seja o ponto médio de . Mostre que o quadrilátero é inscritível se, e somente se, as retas e são perpendiculares.
Solução: Considere . Provaremos que (o que nos permitirá concluir que o quadrilátero é inscritível). Vamos calcular outros ângulos da figura em função de até "descer" para o ângulo .
Para nos ajudar, considere o ponto de encontro entre as retas e .
Observe que é o ponto médio da hipotenusa e assim . Assim, é um triângulo isósceles e assim . Como , segue que e assim . Desta forma, é um quadrilátero inscritível.
Basta calcularmos alguns ângulos da figura até provarmos que . Considere . Calculemos outros ângulos da figura em função de .
Podemos nos inspirar no caso anterior. Por exemplo, aqui dá para usar novamente que é ponto médio da hipotenusa , de onde podemos concluir que . Como é um triângulo isósceles e , segue que . Assim .
Mas de onde segue que e assim é perpendicular a .
Exemplo (IMO 2017)[]
Sejam e pontos distintos sobre a circunferência tais que não é um diâmetro de . Seja a reta tangente a em . O ponto é tal que é o ponto médio do segmento . O ponto escolhe-se no menor arco de de maneira que , a circunferência circunscrita ao triângulo , intersecta em dois pontos distintos. Seja o ponto comum de e mais próximo de . A reta intersecta pela segunda vez em . Demonstre que a reta é tangente a .
Solução: Vamos começar com uma boa figura:
Como os quadriláteros e são cíclicos, . O primeiro ângulo sendo igual ao último implica que as retas e são paralelas. Seja a interseção entre e . Do paralelismo, segue que , mas, dado que é uma tangente a , podemos dizer também, por ângulo de segmento, que , e essa última relação implica que é um quadrilátero cíclico.
Como é o ponto médio do segmento , então ; isso, junto a e nos dá a congruência de triângulos pelo caso LAAo, o que significa que , e as diagonais de se intersectam num ponto médio comum, o que significa que é um paralelogramo e .
Assim, . Como é cíclico, . Então, temos que , o que, por ângulo de segmento, significa que é tangente a , como queríamos!
Exemplo (Cone Sul 2012)[]
Em um quadrado , seja um ponto sobre o lado , distinto de e . No triângulo traça-se as alturas e , e seja o ponto de interseção das retas e . Demonstre que .
Solução: É suficiente mostrarmos que e pertencem à mesma circunferência. Com efeito, como , concluiremos que será o diâmetro desta circunferência e assim será igual a .
Vamos calcular algumas medidas de ângulos para ver se podemos encontrar alguns ângulos de mesma medida envolvendo e .
Considere e os pontos de encontro de e com e , respectivamente.
Seja . Como , segue que e assim . Além disso, (pois é um quadrado) e . Com isso, os triângulos e são congruentes pelo caso . Assim, . Se combinarmos isto com o fato de que ,
Analogamente, os triângulos e são congruentes e . Por essas duas últimas igualdades e pelo fato de que , segue que os triângulos e são congruentes pelo caso . Desta maneira, .
Observe que é inscritível, pois . O mesmo vale para o quadrilátero . Se combinarmos estes fatos com ,
Desta forma é inscritível. Mas sabemos que também é. Logo, e estão sobre a mesma circunferência, de onde segue que .
Exemplo (OBM 2013 - 3ª Fase - Nível 2)[]
Seja um triângulo. Seja um ponto na circunferência circunscrita ao triângulo e sejam e os pés das perpendiculares de até e , respectivamente. Finalmente, seja o ponto médio . Sendo o ponto médio do lado , prove que as retas e são perpendiculares.
Observação: Suponha que o ponto é distinto do ponto .
Solução:
Vamos encontrar o máximo de informações possíveis sobre a figura. Neste caso, podemos encontrar vários quadriláteros inscritíveis. Comecemos usando o fato de que é um quadrilátero inscritível. Se , então .
Melhor ainda: conseguimos outro quadrilátero inscritível. Como , segue que é também um quadrilátero inscritível. O que podemos tirar disso? Como , segue que .
E olha que legal: e possuem mesma medida e o mesmo vértice. Conseguimos alguma relação interessante por causa disso? Sim:
.
Além disso, como é inscritível, . Com isso, os triângulos e são semelhantes pelo caso . Assim,
Mas estes lados também estão relacionados aos triângulos e (que também possuem um ângulo em comum). Será que conseguimos concluir uma semelhança daqui? Observe que é equivalente a
Além disso, . Logo, os triângulos e são semelhantes pelo caso .
Podemos aproveitar uma coisa dessa semelhança. Como e são pontos médios dos lados e , respectivamente, segue que . Com isso, é inscritível. E o que é legal aqui, é que nesse quadrilátero aparece o ângulo que queremos provar que é igual a : . Observe que . Se mostrarmos que , terminaremos o problema.
Desta forma, se for o ponto de encontro entre os segmentos e , segue que e assim é inscritível e como , podemos concluir que . Portanto, .
Exemplo (OBM 2010 - 3ª Fase - Nível 2)[]
As diagonais de um quadrilátero inscritível se intersectam em . Os círculos circunscritos aos triângulos e intersectam as retas e , pela segunda vez, nos pontos e . Prove que o quadrilátero está inscrito em um círculo de centro .
Solução: Uma das maneiras de fazermos isto é mostrarmos que
.
Uma estratégia é usarmos o fato de que, em uma circunferência, ângulos iguais "enxergam" arcos iguais.
Como é inscritível, segue que . Se olharmos para a circunferência circunscrita ao triângulo , podemos concluir que e assim . Analogamente, .
Se provarmos que , terminaremos o problema. Como sabemos várias informações sobre ângulos, procuraremos provar que . Considere . Mostraremos que .
Vamos achar ângulos na figura em função de até encontrarmos em função de . Observe que . Como é inscritível, . Mas parece que estamos tão longe do ângulo . Podemos movê-lo para mais perto? Sabemos que é inscritível. Assim, . O quadrilátero é inscritível, de onde segue que e, finalmente, .
Exemplo (OBM 2014 - 3ª Fase - Nível 2)[]
Sejam um diâmetro da circunferência e uma corda perpendicular a tal diâmetro. Sejam ainda o ponto de interseção entre e e um ponto qualquer sobre a corda diferente de . As retas e intersectam novamente em e , respectivamente. Se é o circuncentro do triângulo , mostre que a área do triângulo é sempre a mesma para qualquer que seja o ponto escolhido.
Solução: Os pontos e são fixos na figura, portanto, para que a área de seja sempre a mesma, a altura relativa a deve permanecer a mesma, em outras palavras, a distância entre e deve ser a mesma, o que significa que deve estar numa reta paralela a fixa. Como , a reta pela qual passa deve ser perpendicular a . Como os pontos e variam enquanto é fixo, segue que a reta a qual pertence deve ser a mediatriz entre e um outro ponto fixo de , o que indicaria que o outro ponto pelo qual o circuncírculo de intersecta é fixo. Se desenharmos esse circuncírculo, veremos que ele passa pelo centro de . Vamos provar que isso de fato acontece.
Como vamos trabalhar com o centro de , é bom darmos um nome a ele, então seja o centro de . Temos que provar que é cíclico. Pela relação do ângulo inscrito, temos que . Para provar o que queremos, precisamos que , felizmente, como é cíclico, , então precisamos provar só que ... mas isso significaria que é cíclico; podemos provar isso? Sim! Como e é um diâmetro de , temos que , portanto temos e cíclico, como queríamos!
Exemplo (Cone Sul 2004)[]
Dada uma circunferência e um ponto exterior a ela, traçam-se por as duas tangentes às circunferências, sendo e os pontos de tangência. Toma-se um ponto sobre o menor arco de . Seja a interseção da reta com a perpendicular a traçada por , e seja a interseção da reta com a perpendicular a traçada por .
Demonstre que, ao variar no arco , todas as retas passam por um mesmo ponto.
Solução: Seja um ponto pertencente a tal que é perpendicular a .
A estratégia aqui é mostrar que é um paralelogramo. E como isso nos ajuda? Sabemos que as diagonais de um paralelogramo se encontram no seu ponto médio. Desta forma, sempre irá passar pelo ponto médio do segmento (que é sempre o mesmo quando variamos ).
Como podemos provar que é um paralelogramo? Uma das maneiras é mostrarmos por ângulos. Considere e . Observe que o quadrilátero é inscritível, pois . Então .
Observe que é um ângulo de segmento (pois é tangente e é secante à ). Desta forma,
Além disso, é inscritível, pois . Assim,
Desta forma, como , segue que e são paralelos.
Como é um ângulo de segmento, pelo mesmo processo que fizemos, . Mas, como já vimos, é inscritível. Assim, .
Já que , e são paralelos. Assim, é um paralelogramo e assim e se cruzam no seus pontos médios, ou seja, sempre passa pelo ponto médio de .
Exemplo (OBM 2003 - 3ª Fase - Nível 3)[]
Seja um losango. Sejam e pontos sobre os lados e , respectivamente, e tais que as retas e são tangentes à circunferência inscrita no losango.
Prove que as retas e são paralelas.
(Você pode encontrar soluções envolvendo o teorema de Brianchon aqui.)
Solução: Como se mostra que duas retas são paralelas? Uma maneira é por ângulos. Por exemplo, se mostrarmos que , então o problema estará resolvido. Para provarmos isto, mostraremos que os triângulos e são semelhantes. Como isto nos ajuda? Desta semelhança, poderemos concluir que . E como isso nos ajudará a provar ? Observemos que se a semelhança for provada, então como e são paralelos,
Daí poderíamos concluir que e são paralelos. Ou seja, para resolvermos o problema, basta provarmos que e são semelhantes. Como podemos provar esta semelhança sem usar um de seus ângulos? Uma das maneiras é aproveitar que (pois são ângulos opostos de um paralelogramo) e mostrar que .
Uma maneira interessante seria encontrar outras razões para podermos mexer com esta. E melhor ainda se esta razão tivesse uma ou mais medidas que também aparecem em .
Para isto, vamos encontrar mais informações sobre a figura. Se possível, igualdades boas entre ângulos. Seja o centro da circunferência inscrita ao losango. Então e são bissetrizes dos ângulos e , respectivamente. Mas lembre-se: as diagonais de um losango coincidem com as suas bissetrizes. Desta forma, é justamente o ponto de encontro das diagonais.
Se considerarmos (sim, definimos como e não como , pois em algum momento iremos dividir por e não estamos interessados em mexer com ), então . Desta forma, . Por isso, vamos focar nos triângulos e pela última igualdade, vemos que eles possuem um dos ângulos com mesma medida. Se acharmos outra medida igual, veremos que eles são semelhantes. E por que isto seria interessante? Porque eles possuem dois lados que aparecem em : e .
Vamos colocar pontos de tangência para encontrar mais informações sobre a figura. Considere e os pontos de tangência da circunferência inscrita com os lados e , respectivamente.
Façamos o arrastão, ou seja, encontraremos ângulos da figura em função do que já conhecemos. Observemos que (pois ângulos consecutivos de um paralelogramo são suplementares) e assim . Além disso, é inscritível (pois ) e assim
Como e são retas tangentes, segue que . Além disso, como e são tangentes, segue que . Para nos ajudar com este arrastão, consideremos . Daí . Se olharmos para o triângulo , descobriremos que . Se descobrirmos um ângulo do triângulo que também tenha essa medida, conseguiremos a semelhança desejada.
Notemos que e são tangentes e assim . Como
segue que
Desta forma, . Com isso,
Desta maneira,
Se compararmos com ,
Com isso, e são semelhantes pelo caso . Desta forma
Aqui temos uma vantagem: conseguimos calcular e em função da diagonal . De fato, se a medida desta for , então e assim
Analogamente,
Logo
Esta é a equação : justamente o que queríamos mostrar.
Exemplo (IMO 1998)[]
No quadrilátero convexo , as diagonais e são perpendiculares e os lados opostos e não são paralelos. Suponha que o ponto , onde as mediatrizes de e se encontram, está dentro de . Prove que é um quadrilátero cíclico se, e somente se, os triângulos e possuem áreas iguais.
Solução:() Como precisamos usar a ideia de que as diagonais são perpendiculares, considere o ponto de encontro entre e . Vamos supor, sem perda de generalidade, que pertença ao interior do triângulo .
(Ida, Ver. 1) Uma estratégia aqui seria calcular as áreas dos triângulos e com segmentos comparáveis, ou seja, de forma que a gente possa concluir a igualdade a partir das expressões formadas. Mas para isso, vale a pena começarmos procurando alguns segmentos iguais.
Como as mediatrizes das cordas passam pelo centro, segue que as mediatrizes de e também passam por lá, de onde segue que é o centro de . Assim .
Calcularemos de modo que podemos calcular de modo parecido depois e compararmos seus resultados. Vamos comparar as áreas de com a de (que para ser calculada, podemos usar que as diagonais são perpendiculares):
Para calcularmos as áreas de e precisamos das suas alturas. Por isso, considere e os pés das perpendiculares de em relação a e , respectivamente. Assim,
Como (já que as diagonais são perpendiculares entre si) e (pela definição de e ), segue que é um retângulo. Assim e . Desta forma,
Qual é a vantagem disso? Todos os segmentos envolvidos na área estão contidos nas diagonais e fica mais fácil mexermos com eles (no sentido de podermos combiná-los com adições e subtrações). Já que aparece em duas partes da nossa conta, podemos melhorá-la.
Será que algum desses podem nos dar alguma igualdade com segmentos que envolveremos no cálculo de ? Observe que como (já que é o centro do círculo) e é a altura relativa a no triângulo , podemos concluir que ela também é a mediana e assim . Analogamente . E como podemos fazer alguns desses segmentos aparecer no cálculo de ? Note que e . Ao fazermos essa substituição,
De modo parecido, podemos concluir que
Como e , podemos concluir que .
(Ida, Ver. 2) Assim como na Versão 1, teremos que e . Pela relação do ângulo inscrito, e , mas, como , , ou seja, eles são suplementares.
Para calcular as áreas de e , podemos usar a fórmula trigonométrica para a área de um triângulo. Dessa forma:
e
Mas, como e , , o que significa que .
() Vamos usar a contrapositiva aqui, ou seja, supor que não é cíclico e provar que e possuem áreas diferentes. Por e , uma boa estratégia parece comparar e com e .
Como podemos usar que não é cíclico? Se isso ocorre, não existe nenhum ponto que seja equidistante a . Mas observe que como pertence às mediatrizes de e , podemos concluir que e . Mas não podemos ter todas essas medidas iguais. Por isso, podemos supor, sem perda de generalidade, que .
Podemos olhar para o triângulo já que nele aparece os lados e e se traçarmos sua altura , teremos também e , ou seja, medidas que precisamos lidar. Sabemos que . Podemos usar isso para conseguir uma desigualdade com e ? Se usarmos o teorema de Pitágoras nos triângulos e :
Analogamente, . Se usarmos as duas últimas desigualdades em e , iremos obter e . Portanto, as áreas são realmente diferentes.
Exemplo (RMM 2018)[]
Seja um quadrilátero cíclico e seja um ponto sobre o lado . A diagonal encontra o segmento em . A reta que passa por paralela à encontra o prolongamento do lado por em . A reta que passa por paralela à encontra o prolongamento do lado por em . Prove que os circuncírculos dos triângulos e são tangentes.
Solução: Fazendo uma boa figura, é razoável perceber que e têm um ponto comum com o circuncírculo de , e que esse ponto está alinhado com . Vamos provar isso.
Seja a interseção de com o circuncírculo. Precisamos provar que pertence a e , ou seja, que e são inscritíveis.
Primeiro, podemos perceber que, como é cíclico e , temos que: , o que prova que é cíclico.
Então, como é cíclico e , temos que: , o que prova que é cíclico.
Como é um ponto comum entre e , ele deve ser o ponto de tangência. Mas como provamos que as duas circunferências são, de fato, tangentes?
Podemos provar que as tangentes a e por são paralelas, provando que elas são a mesma tangente e que as circunferências são, de fato, tangentes. Vamos fazer isso: sejam e os ângulos que a reta faz com as retas tangentes a e por . Para que as duas sejam paralelas, devemos ter .
Por ângulo de segmento, e . Mas , o que prova e finaliza o problema.
Teorema de Reim[]
Esse teorema trata de uma "configuração fixa" que tem algumas propriedades. O Teorema de Reim nos assegura que se essa configuração tem só alguma de suas propriedades, então ela tem todas.
Variação 1: Dois círculos se intersectam nos pontos e . Os pontos e estão no mesmo círculo. Se as retas e intersectam o outro círculo em e , respectivamente, então, as retas e são paralelas.
Variação 2: O quadrilátero é cíclico. Se os pontos e estão em e de forma que e são paralelas, então é cíclico.
Variação 3: O quadrilátero é cíclico e o ponto está em . Se o ponto está no circuncírculo de de forma que é paralela a , então pertence a .
Esse teorema serve para mostrar que conciclicidade e paralelismo estão bastante relacionados. As demonstrações das três variações podem ser feitas por marcações de ângulos.
Exemplo (IMO 2019)[]
No triângulo , o ponto está no lado e o ponto está no lado . Sejam e pontos nos segmentos e , respectivamente, tal que é paralelo a . Seja um ponto na reta , tal que está estritamente entre e e . Analogamente, seja um ponto na reta , tal que está estritamente entre e e .
Prove que os pontos , , e são concíclicos.
Solução: Parece ser muito difícil relacionar os pontos e aos outros dois, mas o paralelismo deve lembrar o Teorema de Reim... mas como o utilizamos? Precisaríamos de um quadrilátero cíclico que contenha . Para isso, vamos prolongar e até atingirem o circuncírculo de em e , respectivamente.
Utilizando o Teorema de Reim, temos que é cíclico. Será que conseguimos provar que e também estão nessa circunferência? Podemos tentar. Há algo que não usamos: a condição angular esquisita de e . Como está em , temos que
O primeiro ângulo ser igual ao último significa que é cíclico. Analogamente, também é. Agora, para provar que e estão em , usamos o paralelismo novamente:
O que prova que pertence a . Podemos fazer um raciocínio análogo para , finalizando o problema.